Crime de apropriação indébita no ICMS poderá ser usado como forma de cobrança indevida pelo Fisco
Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento daquela corte sobre a caracterização de crime pelo não pagamento do ICMS e entendeu que a falta de recolhimento do tributo aos cofres públicos caracteriza nítido crime de apropriação indébita.Diante dessa decisão, o fisco poderá se valer de forma oblíqua de cobrança de tributo, obrigando o contribuinte a pagar o ICMS mesmo que seja ilegal, o que poderá ser rechaçado pelo Poder Judiciário.
No caso em análise, o contribuinte deixou de recolher o tributo no prazo legal e buscava a concessão de um “habeas corpus” após ser denunciado pelo Ministério Público de Santa Catarina por crime tributário de apropriação indébita.
A defesa alegava que o ICMS, apesar de não ter sido recolhido, havia sido declarado ao Fisco e, por isso, a ação não caracterizaria crime, mas mero inadimplemento fiscal, entendimento que predominava em nossos tribunais.
Contudo, o relator destacou que o tema possui relevância social e econômica diante da magnitude dos impactos que o ato de não quitar os débitos tributários provoca, notadamente pelas consequências indiretas, as quais implicam, dentre outras, o aumento das desigualdades sociais.
Destacou que, no exercício de 2016, a sonegação subiu de 7,6% para 9,1% do PIB, o que representou uma perda de R$ 571,5 bilhões aos cofres públicos. Tomando-se em consideração este indicador de sonegação, poder-se-ia afirmar que, se não houvesse evasão, o peso da carga tributária poderia ser reduzido em quase 30% e ainda seria mantido o mesmo nível de arrecadação. Assim, entendeu que a sonegação prejudica os bons pagadores com uma carga tributária mais elevada.
Para o relator, a prática deve ser considerada crime para não prevalecer, entre o empresariado, o entendimento de que é muito mais vantajoso deter os valores do tributo do que se submeter a empréstimos no sistema financeiro. Medida que traz prejuízo ao Estado e aos contribuintes.
Diante do entendimento de que o valor do tributo é cobrado do consumidor, o não repasse pela indústria aos cofres públicos deve ser considerado apropriação indevida, prevista como crime no artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90.
Para a caracterização do crime, deverá ser constatada a conduta direcionada pelo dolo de se apropriar de forma indevida do valor que deveria ser recolhido ao fisco, circunstância essa a ser extraída dos fatos em cada caso concreto, esclarecidos em instrução criminal, com o devido contraditório e oportunidade de produção de provas.
O Fisco poderá utilizar essa decisão de forma irrestrita, o que acarretará a responsabilização por crime como meio oblíquo de cobrança de tributo, obrigando o contribuinte a pagar o imposto mesmo que ele seja ilegal ou que suas bases não sejam corretas, apenas para se livrar de eventual condenação no juízo criminal. Entretanto, nesses casos inexistirá dolo.
Como descrito na decisão do Superior Tribunal de Justiça, eventual condenação por crime tributário necessitará da constatação de dolo. A ilegalidade na cobrança do tributo é uma circunstância que evidencia a inexistência de dolo na falta de pagamento do tributo. Assim, constatando a inexistência de dolo o juízo criminal deverá absolver o contribuinte de eventual crime.
Caso tenha alguma dúvida, entre em contato com o Jurídico da Associação.

Marcelo Boaventura – Assessor jurídico da ABIEA